quinta-feira, 16 de agosto de 2018

O psicodrama como questionamento

Há muito tempo ando com um pensamento e devo ter  repetido várias vezes em outros textos: tão importante quanto fortalecer os grupos minoritários, é fundamental questionar aqueles que têm o poder, partindo do princípio de que eles não devem ditar as normas e nem ser vistos como a única realidade. E além disso, questionar as próprias normas em si.

Esse texto maravilhoso do Túllio, que parte de uma experiência pessoal, me fez pensar novamente nisso. E também em como determinadas narrativas de grupos minoritários acabam por vezes contadas por aqueles que detém privilégios.

Para citar um exemplo, eu me lembrei de uma treta que rolou em relação a um episódio de “Orange is The New Black”. Eu nunca assisti à série, mas sei que ela é aclamada por questões de representatividade racial e conta com uma atriz trans. Só que em um episódio, parece que uma personagem negra diz que os maiores racistas são os próprios negros. Então, alguns contatos de redes sociais, negros americanos, lembraram do fato de que a equipe de roteiristas da série era formada inteiramente por pessoas brancas. Um psicodrama que não deu certo.

Uma das experiências mais interessantes que tive foi conhecer o trabalho da Laurice Levy que me apresentou melhor o psicodrama de Moreno. Para quem não conhece, é uma terapia na qual a pessoa pode “interpretar” outras pessoas como forma de abertura emocional, o famoso “se colocar no lugar do outro”. Eu, por exemplo, já usei a técnica em sociodramas em oficinas com jovens, nas quais eles representam outros papéis da sua realidade como forma de abrir uma discussão sobre um certo tema e tive ótimos resultados.

Daí penso o quanto podemos inverter essa lógica, ocupando outros lugares em um outro psicodrama, diferente das interpretações ao estilo da série citada. Sendo assim, tão importante que negros falem sobre si mesmos, é fundamental também tomar determinados espaços dominados por brancos e questionar a branquitude como nornalidade. Vale também para lésbicas, gays e bissexuais em relação a heterossexualidade, pans e bissexuais para a monossexualidade, trans para cissexualidade e por aí vai. Assim os discursos além de ganharem força, ganham multiplicidade e isso enriquece as nossas visões e ajuda no fortalecimento daqueles grupos que se encontram em situação de subalternidade. E também, ao perceber essa multiplicidade, quebrando com certas normatividades, podemos ter mais liberdade e não mimetizá-la, como ocorre com gays heteronormativos, pretos que endeusam a branquitude e outros casos do tipo.

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