domingo, 8 de junho de 2008

Será?


Pode parecer um clichê. Algo que você está cansado de escutar o tempo todo. Eu pelo menos estou. No entanto parece fato: as pessoas estão mais preocupadas em falar do que ouvir. E quando me disponho a falar as histórias ficam inconclusivas, por conta dos delírios narcísicos de cada um.

Será que é por isso que a Internet virou uma válvula de escape para a solidão?

Será que é por isso que os remédios fazem mais sucesso que as terapias, na qual a pessoa simplesmente não fala, mas é obrigada a ouvir. Não as palavras do analista/terapeuta, mas principalmente, si mesmas.

Será que as pessoas incapazes de ouvirem o que o outro tem a dizer são capazes de ouvir a si mesmas? O falatório narcisista será uma maneira de livrar um encontro doloroso consigo mesmas?

Araruama e esse período desconectado me fazem bem. Sou obrigado a escutar mais a mim mesmo e me afasto dos discursos narcisistas, sejam eles teclados ou falados.

Duas Caras II

Duas Caras (2)

Como essa semana já se encerra a novela, deixei de preguiça e resolvi postar meus comentários sobre “Duas Caras”, com alguns personagens e questões que foram abordadas na trama:

- Evilásio Caó, o p´ríncipe da Portelinha?

Em sua segunda telenovela, Lázaro Ramos mostra que é capaz de lidar bem com o gênero e interpretar uma personagem que difere muito do seu anterior “Foguinho”. Vejamos, Evilásio é filho de Misael Carpinteiro- um dos fundadores da Portelinha-, irmão de Gislaine e afilhado de nada mais nada menos de que Juvenal Antena, o déspota quase esclarecido da comunidade.

Como é sabido “padrinho” é o segundo pai e é com Antena que Evilásio terá o seu maior embate que em muito se assemelha às relações de pais e filhos, sendo que em jogo está uma comunidade. Além disso ele terá que lidar com outro vilão, comum à maioria dos brasileiros: o racismo, encabeçado pelo seu futuro sogro, Barretão. Esses fatos credenciam Caó a ser o herói romântico da trama, somando-se a isso um romance – como todo folhetim pede- com uma moça branca e de classe social acima da sua: Júlia.

Existe um momento da vida em que nos damos conta de que nossos pais não são infalíveis (castração) e que, em decorrência dessa falha, nós corremos em busca de outros objetos, em substituição às figuras parentais e somos obrigados a fazer escolhas. E como somos incompletos, cada escolha implica no abandono de outra, ainda que muitas vezes hesitamos com medo de perder o amor dos pais. Com Evilásio não é diferente.

Ele é criado junto com Juvenal, trabalhando na Associação de Moradores. Em um dado momento percebe-se de que a vida chama Evilásio a olhar para além da favela, a visslumbrar novos horizontes. Neste momento ele conhece Julia, a moça que vem de fora da Portelinha, e entra em atrito com os métodos de Juvenal Antena, com quem se envolve em uma disputa política até Antena se dar conta de que, diferente de Evilásio, ele só é rei na Portelinha. Se a alteridade é fundamental para que nos reconheçamos, com Juvenal isso só se dá na comunidade. Diferente de Evilásio, que tem a necessidade de sair dali e realizar o seu projeto de ser o representante da favela na Câmara Municipal.

Em relação a Juvenal já fiz comparações com “Totem e Tabu” de Freud. Com Evilásio a idéia se repete, sendo que em princípio ele não deseja o assassinato do pai (Juvenal) mas deseja trabalhar junto com ele. Mas talvez o grande “tabu” que existe para os planos de Caó não é Juvenal Antena em si, mas a Portelinha, comunidade que é seu objeto de amor.

Sílvia

Esqueçamos a nomenclatura antiga psiquiátrica que dividia os loucos em neuróticos e psicóticos e aprendamos o que é o transtorno Boderline, no qual a pessoa se mostra extremamente agressiva quando seus objetivos não são alcançados, somados a surtos de depressão e tentativas de suicídio. Esqueçamos também as mulheres eternamente loucas, histriônicas e sem sentido de Manoel Carlos, e vamos nos divertir com a vilã desequilibrada e por muitas vezes cômica, de Aguinaldo Silva..

A personagem, aparentemente uma menina insossa que estudou na Sorbonne e que volta ao Brasil após o falecimento do pai vai mostrando a sua “outra cara” a partir que começa o seu relacionamento com Marconi Ferraço e esta fica mais acentuada graças a uma outra personagem: Renato, filho de Ferraço com Maria Paula.

Interessante observar a disputa narcísica que ela apresenta diversas vezes, o que de certa forma pode até fazer pensar sobre o Complexo de Édipo. Silvia sempre foi uma menina mimada que, de acordo com sua mãe, sempre teve tudo o que quis graças ao pai. Silvia não sabe lidar com as faltas. Quando o pai lhe falta, na morte, ela encontra um substituto em Ferraço, união a que a mãe se opõe e que é o motivo principal da briga das duas durante a trama, fazendo lembrar a rivalidade mãe e filha. Outra mulher que aparece em seu caminho e que lhe representa uma ameaça é Maria Paula, uma mulher capaz de obter o amor de Ferraço, algo temerário à Silvia. E por fim, a presença de Renato, uma criança tão cheia de vontades, talvez, quanto a adulta madrasta que passa a trama tentando achar mil formas de eliminar o menino, já que este aos poucos vai ganhando a atenção e o amor de Ferraço, a ponto de Silva simular um acidente da escada na festa de aniversário do menino e assim obter a atenção de todos.

O flerte de Silvia com a “morte” não se dá somente nas tentativas de assassinato ou no seu suposto acidente. Ao conhecer o motorista João Batista (JB) que representa socialmente tudo o que ela detesta – ele é pobre, favelado e, no fetiche da mesma, fedorento- ela decide mostrar uma sexualidade fetichizada por motéis baratos e onde ela pode exercer peno poder anulando qualquer tentativa de desejo do outro. Ela quer JB submisso a ela, fazendo todas as suas vontades de maneira obediente. Se Freud afirma que no masoquismo há uma fusão pulsional (da libido e da pulsão de morte) é por ela que a personagem tenta manter, de forma caduca, a atenção de todos sobre si.

Outras personagens / tramas

A novela apresentou diversas personagens com suas tramas particulares e o jogo do duplo. Algumas tramas forma bem aproveitadas, como o núcleo da Portelinha que mostrou diversas questões:

Alzira: a personagem dividida entre o “dever” que tomou para si mesma de cuidar dos filhos e do marido – revestindo de si como heroína- e o desejo de brilhar nos palcos na famosa “dança do cano” (elemento fálico?)

Os Evangélicos De um lado Edivânia, a fanática que poderia beirar a caricatura mas, que de certa forma representa uma parte da realidade evangélico-fanática de nosso país, em especial nas comunidades mais pobres. A caricatura não é de Suzana Ribeiro. Talvez seja o caso de se pensar que, no afã narcisista de buscar uma saída para uma vida medíocre e se sentir especial e eleito por uma entidade maior e se sentir superior a todos, não estariam muitos evangélicos se tornando caricaturais e escamoteando o que tem de melhor em si mesmo, contrariando assim o ensinamento daquele que eles dizem acreditar. A melhor resposta para isso está em Ezequiel, que representa não o lado puramente religioso, mas também como a espiritualidade e a ligação com o divino pode-se dar de outra forma e que isso pode ser usado para o bem de todos.

Ainda no campo religioso houve a presença de mãe Bina e o dilema de Andréia Biju de assumir o terreiro. A personagem que em princípio quer ser a rainha de bateria da escola, não se dá conta, ou tem medo, de perceber que seu trono é outro. Curiosa trama para uma personagem que teve que cuidar desde cedo da irmã mais nova, assumindo o lugar da mãe (eas são órfãs) e se vê em um dilema para se tornar uma mãe-de-santo.

Personagem mal aproveitada por sua vez foi a Branca, em atuação histriônica de Suzana Vieira, que só teve momentos mais interessantes ao lado de Alinne Moraes (Silvia) e de certa forma, Renata Sorrah. Muitos criticam a personagem Célia Mara de Sorrah, mas é fato que no jogo duplo de espelhos invertidos – uma desejando o que a outra não tem- ela se saiu bem melhor que Suzana Vieira, seja em suas brigas – por vezes cansativas ao público – ou em seus monólogos no qual culpava a todos por sua desgraça. E nesse meio temos um Jo´se Wilker apático no papel do insípido professor Macieira, personagem que poderia ter rendido mais e muito aquém do talento de Wilker.

A esquerda festiva simbolizada nesta falácia chamada “movimento estudantil” encontrou em Rudolf a sua maior crítica, não distante da realidade. Rudolf é o negro patrulheiro, chato, que posa de politicamente correto e se faz de pobre. Todavia anda o tempo todo com pessoas brancas, ricas, despreza as pessoas da Portelinha – alguns alunos da mesma raça dele – e descobrimos lá pelas tantas que ele é rico e trata com desprezo os seus empregados. Está aí uma boa metáfora do que representa muitos setores da esquerda brasileira- chamada de esquerda festiva- que diz adorar os pobres, mas sabemos que ela os quer bem longe. Isso explica em parte porque certos movimentos não deram certo no Brasil, em que até parte dita esquerda repetiu os mecanismos de concentração de renda e disparidade social seculares- e do movimento estudantil, que se tornou, pela UNE um monopólio de militantes imaginários e que os estudantes de forma geral só se lembram dela por conta de carteirinhas de meia-entrada e daqueles protestos vazios “contra o FMI”. E junto com isso, Rudolf mostra talvez o perigo da militância negra sem sentido, aquela que se limita a ver racismo em tudo e se esquece de atacar os reais problemas que fazem com que nós negros, maioria neste país, estejamos marginalizados em um país que se recusa a ver o óbvio enquanto a parcela mais clara da população delira com suas ascendências européias esquecendo-se de que está nos trópicos.

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E a elite vem representada pelo casal Gioconda e Barreto. A primeira cria um movimento chamado “Chega” – alguma semelhança com o “Cansei”? – após a amiga ser assaltada no calçadão. Se por um lado pode parecer coisa de perua desocupada, por outro pode ser um caso a pensar: será que só os pobres podem protestar? Casado com ela, Barretão, se mostra um racista que esconde da mulher a avó que fugiu com um negro. Nesse sentido faltou ousadia a Aguinaldo ou uma ligação melhor com a realidade que poderia fazer de Barretão neto deste negro.

Por fim temos a Portelinha, talvez ela mesma uma personagem.. As personagens, a exemplo de Lucimar, são dúbias, divididas, não diferente de todos nós. Uma hora vacilam em votar em Evilásio ou continuar sob os desmandos de Juvenal Antena e a sua “justa-mente” que decide o que deve ser feito ou não dentro da comunidade.

domingo, 1 de junho de 2008

Vento Nordeste

Ai alguém aparece de mansinho, sem ser vento, sendo sol. Apesar de toda ansiedade. O Cristo abre os braços para mais um "estrangeiro", o estranho encontro da minha vida, se tornar mais familiar...o Odilon agora é outro: é pego de surpresa quando menos se espera, com um certo vazio, sentindo a falta de alguém que tornou as últimas horas em momentos muito felizes. E os momentos felizes sempre têm a pretensão de serem imortais.