quinta-feira, 1 de abril de 2010

Que ressurreição buscamos?

Se há um tema que nunca mencionei aqui é religião. Tenho vários motivos, mesmo sendo católico praticante. Entre eles cito o fato de que Deus existe sim, mas não para satisfazer nossos caprichos ridículos e que ele quer mais que nos viremos. Outro é que meu texto pode soar puro proselitismo e religião lida com verdades eternas e imutáveis e portanto, não hpa espaço para uma discussão ou reflexão. Por isso, pessoas muito "religiosas", me dão certo asco. Claro que todos tem direito a viver ou não a sua espiritualidade e tenho amigos de convívio de diversar matrizes religiosas e muitos que são ateus ou agnósticos. Isso não invalida o que sinto por cada uma deles. Outro fato é que intolerância e radicalismo pode ser visto em pensamentos que até mesmo negam a existência divina. O socialismo real foi uma prova viva disso.

Mas por que mencionei religião? Ah sim, é época de Páscoa. Para nós católicos representa o sofrimento de Jesus na cruz até a sua ressurreição, símbolo de vitória sobre o mal para qualquer cristão.

Meu primo, evangélico pentecostal, dizia que a visão católica de um Jesus sofrido era ruim, porque ele era vitorioso, glorioso e que sofrimento não combinava com ele. Está ai uma das chaves para o sucesso desses cultos e mais ainda, dos neopentecostais, com igrejas lotadas. Agora é hora de olhar os fatos não por um viés religioso/espiritual, mas sim, cultural/social/psicológico.

Vivemos em um tempo que tentamos o tempo todo negar o sofrimento. Pílulas de emgrecimento rápido - a sibultramina está ai como a vilã da vez- antidepressivos e tantas outras coisas prometem, tal como o discurso do pastor, a glória, a vitória eterna. Empresas treinam seus funcionários para o sucesso a qualquer custo, aumento das vendas, lucro, sempre a vitória.

Não há problema em querermos ter uma vida ótima. Ainda bem que o progresso científico nos trouxe benesses que nos aliviam de diversos males. Imagine a vida antes da invenção da anestesia, por exemplo. E imagina isso nos tempos atuais onde matamos mais que nunca? Não é "pecado" querermos ser bem sucedidos.

O perigo está na negação do sofrimento. Viver implica em vitórias, de acordo com os nossos esforços, que isso fique bem claro e ao mesmo tempo há frustrações, sofrimentos e perdas. E é isso que queremos negar.

Um amigo meu, umbandista, me explica que muita gente sai dos cultos afro para os evangélicos porque nestes últimos há uma promessa eterna de alegria e felicidade apoiados numa ideia de Deus que pode cumprir tudo e satisfazer seus caprichos mais mesquinhos, bem como "apagar" os seus erros na falsa ideia que tais igrejas trazes sobre o perdão. Errada porque se Jesus representa a forma humana de Deus e que ele se faz presente no amor que devemos ter uns com os outros, é na relação com os outros que deve existir o perdão e a alegria e não em uma oração para uma entidade distante e abstrata como muitos de nós, crentes, pensamos. Nesses cultos não queremos a coletividade, com suas alegrias e frustrações, mas apenas a satisfação de um capricho egoísta e a crença de que somos especiais, eternos e melhores que os demais por fazer parte de uma determinada denominação.

Por isso a ideia do Jesus sofrido pode sim nos atualizar para esse lado de que a vida implica sim em alegrias e tristezas e que a ausência de tudo isso só se dá mesmo na morte completa, uma ideia incompatível com a crença cristã - e de várias outras religiões- de que há vida eterna.

E espero, nessa Páscoa, que todos nós, independentemente de acreditar ou não em Deus, nos tornemos pessoas melhores e cientes de que a vida tem sim os seus percalços, mas que isso não é desculpa ou motivo para nos encerrarmos em uma depressão egoísta (excluo aqui a patológica) ou que a vida oferece puro sucesso e confundir isso com realizações mesquinhas.

Fetichização da desgraça

Bem, uma adolescente foi estuprada em Londrina e a "culpa" de acordo com os jornais é das "pulserinha do sexo".

http://http//odia.terra.com.br/portal/brasil/html/2010/3/menina_e_estuprada_apos_ter_pulseira_do_sexo_arrebentada_em_londrina_72554.html

Existem representações e afetos. Afetos são o que sentimos e representações são objetos de desejo ou repulsa que aplicamos a este afeto. Explicando essa psicanálise de almanaque que apresento aqui, se alguém tem medo de barata (meu caso), há um afeto: o medo e a representação : a barata.

O "afeto' perverso que se tem é o desejo em estuprar. Se bem que não sei se perverso é a palavra certa. A perversão implica uma negação da norma estabelecida, algo que choca, como é nos dias atuais, de acordo com a brilhante Roudinesco, o terrorista. O estuprador, por mais que nos choque tem a norma machista a seu lado: o cara se sente dono da mulher e pode impor seu poder conforme queira. Eu mesmo já ouvi de homens e de mulheres também a fala " a culpa foi dela que deu mole" ou ainda "bem feito, quem mandou ela usar short curto".

Dessa vez o objeto fetiche para essa representação são essas pulseiras. Elas são o bode expiatório (ou seria espiatório? to sem paciência pro google) da vez. Prefeituras proíbem suas vendas como se isso num passe de mágica evitasse essas barbaridades.

As pessoas tem que parar de negar hipocritamente a existência da sexualidade. Afirma sua existência é o melhor caminho para uma conversar franca com os filhos e colocar que uma vez que somos "sexuados", existem responsabilidades e formas de lidar com o nosso desejo, mesmo que, como diz a música Pecado Original do Caetano, trilha de "A Dama do Lotação" (filme de Neville D'Almeida) "a gente não sabe o luga certo onde coloca o desejo". Ao que parece, tanto os jornais, como os estupradores e alguns legisladores, resolveram colocá-lo nas pulseiras, num belo mecanismo de recalque coletivo, para mascarar o que realmente há por trás disso tudo: a existência e a emergência da sexualidade dos adolescentes e o jogo de poder e violência de uma sociedade machista que trata as mulheres como mero objetos. Se os responsáveis, escolas e demais instituições que lidem com os adolescentes souberem de forma clar, franca e objetiva como lidar com isso, teremos adolescentes menos vulneráveis a situações lamentáveis como essa de Londrina, meninas mais empodeiradas em sua sexualidade e morre a necessidade de atacar pura e simplesmente uma pulseira, quando sabemos que, por trás disso existem questões muito mais sérias.

Homens, mulheres e simpatizantes


A foto ao lado é dele mesmo: Marcelo Dourado. Sim, é triste por um lado perceber que só mesmo o BBB é capaz de mobilizar a produção deste texto. Por outro lado aqui não há espaço para a maldita síndrome de underground, mas antes de comentar a respeito do vencedor da décima edição desse reality show vou relatar um fato que ocorreu há algum tempo que percebi.
Estava trabalhando como facilitador em uma série de oficinas com homens jovens em uma comunidade da Zona Oeste do Rio. Junto comigo havia alguns outros, adultos, moradores das comunidades de onde moravam os jovens e que passaram por uma capacitação para trabalhar com eles. Em uma das oficinas tínhamos que decidir junto com eles, qual seria o nome para uma marca de preservativos que seria desenvolvida em um projeto de marketing social. Uma das sugestões apresentadas pelos rapazes foi "o Homem na Hora H". Um dos facilitadores se pronuncia, no melhor estilo politicamente correto e diz: "esse nome é discriminatório, pois a palavra 'homem' exclui os gays na hora de comprar o preservativo".
E o que Dourado tem a ver com esse relato que apresento? Em uma de suas discussões com Dicésar e na qual ele foi apontado como homofóbico ele disse algo como "não é pelo fato de você ser viado que você não é homem". Há um machismo na frase do lutador? Sim, pois sempre acreditamos que "ir pra luta", "ter coragem", "falar na cara" e qualquer coisa que o valha é um atributo masculino. Por outro lado, há algo muito interessante na fala dele pois , diferentemente do facilitador que trabalhou comigo, o Dicesar é sim gay e ao mesmo tempo, homem.
A homossexualidade, ou melhor dizendo, homossexualidades e indo mais além as masculinidades, assim mesmo com "s", mostram que dentro da chamada diversidade há outras diversidades. Ao mesmo tempo há algo que sempre insisto que não dá para discutir sobre qualquer orientação sexual sem antes, sobretudo, não for pensada a questão de gênero, ou seja, os papéis sociais esperados para homens e mulheres. Para os homens é espero que eles sejam "másculos", "viris" , "macheza" ou qualquer outra coisa que o valha. Tomemos por exemplo 3 exemplos da casa, heterossexuais até então, que mostram posturas bem diferentesde como ser homem: Dourado, o machão-chorão, Cadu, o saradão gente boae Michel, o tonto bonzinho. A despeito desses rótulos que apliquei nos 3 participantes o que há é que existem formar diferentes de ser homem e da mesma forma pode se pensar e incluir nessas formas, a homossexualidade.
Era visível por exemplo ver o Michel apontar em seu discurso que Serginho e Dicesar não eram homens. O mesmo dizia Fernanda para Dourado: "Você tem que tratar o Dimmy como uma mulher". Bem, isso veio da moça que disse que o Uilliam "não é tão preto assim", então não vou esperar grandes lances de inteligência e consciência por parte dela. De qualquer forma é Dourado, o machão homofóbico, que coloca as coisas na roda e aponta que a homossexualidade é só mais um detalhe no que significa ser homem.
Ao que parece o ser humano precisa de padrões para lidar com o desconforto do que lhe é estranho. Se um homossexual tem o que se chama de "straight acting" - sim é uma palavrinha muito infeliz - podem acontecer dois movimentos: o primeiro de causar muita estranheza, já que se precisa do gay que desmunheca para se fazer humor e colocar na categoria "não homem" ou "mulher". Por outro lado há o que se chama de "covering", ou seja ele é gay "mas age como homem", mascarando de vez a homossexualidade. A versão gay do "negro de alma branca" por exemplo.
É nessa esquizofrenia de conceitos e de visões que transita os nossos discursos e a visão que temops sobre gênero, sobre o que categorizamos no nosso dia a dia sobre o que é ser homem e ser mulher. E no meio dessa loucura toda é que podemos perceber, tal como no discurso de Dourado, do facilitador ou de outros, que se parecemos homofóbicos muitas vezes, se olharmos mais profundamente, pode-se confrontar e se mostrar mais além do que visões politicamente corretas que no fundo aprisionam as pessoas nas velhas categorias de sempre só que com uma "roupagem" nova.