sábado, 16 de junho de 2012

O Rei da Evasão


Já é madrugada de uma noite de sábado e, sinceramente, sem saco para escrever qualquer coisa inicialmente. Daí naquela absoluta vontade de ver algo acabei decidindo ver "Le roi de l'évasion"(2009), filme de Alain Giraude. Não me lembro onde nas minhas fuçadas internéticas achei a menção inicial ao filme, provavelmente em algum site básico de putaria por conta das cenas de “cruising” no mato do Sul da França onde se passa a ação. E o que inicialmente para mim parecia um filme sem pé e nem cabeça – e talvez ele seja- ao mesmo tempo se mostrou sensacional em especial por seu desfecho.


Armand (Ludovic Berthillot) é um vendedor de tratores na região de Albi no meio dos Pireneus , gay, solteiro, de 43 anos que vive fazendo sua pegação básica aqui e ali, mas com aquela vidinha mais ou menos entre um cochilo e outro no carro no meio do expediente. Ele se envolve com Curly (Hafsia Herzi), uma adolescente de 16 anos e todo o mote do filme são as idas e vindas dos dois em fuga pela desaprovação dos pais ao relacionamento. Se fosse contar a trama seria simplesmente isso.


No começo o filme me causou estranheza. O som era pobre e desconectado bem como a aparente falta de descontinuidade das cenas. Em dado momento não sabia se era sonho de Armand o que acontecia ou se era real tudo aquilo além de ironias bem sutis durante a trama. Mas o que conta é a caracterização das personagens, do s belos cenários das florestas dos Pireneus e eterna perseguição.


Em uma crítica feita por um espectador no imdb ele dizia que a melhor tradução para o filme, que em inglês foi “The King of Scape” (O Rei da Fuga) poderia ser O Rei da Evasão. Faz sentido, apesar de que em português fuga, escapada e evasão podem ser sinônimas mesmo quando se trata de aspectos psicológicos. E sou obrigado a concordar com essa crítica, é disso que o filme fala.


Armand tem aquela vida de sempre, entre um cochilo e outro e a pegação. A ruptura pode se dar por 3 coisas a meu ver: a paixão dele pela menina, a perseguição policial e o mediador de tudo isso, uma raiz usada como droga, inicialmente no “meio gay” da cidade, mas na verdade a visão de Giraude do filme é interessante por fazer a gente pensar se esse “meio” é tão meio assim.


Esse texto não é uma crítica do filme inicialmente. Fala das minhas impressões também, já que pelo final do filme, dado o diálogo simples entre Armand e Jean (Jean Toscand) é que amarra tudo o que vi ali. Veja, a personagem principal é um cara gordo de 43 anos, ou seja não é o gostosão das personagens gay em geral. Também não é o “urso” estereotipado em filmes, cada uma sua maneira, como em Bear City ou nos (superiores a este) espanhóis “ Cachorro” e “Chueca town”. Aliás sobre esse último pensei em tecer uma crítica a respeito mas só preciso dizer que é engraçadinho  graças as atuações excelentes de Concha Velsaco e Rosa Maria Sardá.


E o paradoxo é que a maior parte das personagens são idosos, incluindo o pai de Curly. E mesmo assim consegui perceber nele um erotismo muito interessante. Se Rousseau apontou com seu Emílio o campo como refúgio e o infantil o contato com o nosso ser não corrompido pela civilização, tal como os índios, no que deu origem ao mito do “bom selvagem”, a imagem de Armand correndo com a adolescente pelos bosques na maior parte das cenas de cueca ou nu me remetem um pouco a essa visão. Aliás é a menina que rompe a sua pulseira , por onde a polícia (metáfora da civilização?) controlava seus passos. É interessante observar como a trama tem suas viradas sem grande suspense ou alarde, já que como no sonho, tudo que é estranho parece natural.


No fim o filme me fez pensar nisso, no quanto a sexualidade por vezes é amarrada. É engraçado que, guardada as devidas proporções, a região em que moro  tem semelhanças com aquela mostrada no filme, por ser no interior, com boa parte da população acima dos 40 anos e sem a presença das boates ou de um “comércio gay”. E com muitos homens casados – o comissário indaga a Armand se ele tem preferência por casados ao que ele responde que é o que acontece, dando uma pista como se dão as coisas no interior- buscando o prazer no meio do mato.  E o melhor, no como colocamos a nossa sexualidade (em sentido mais amplo para além do ato sexual) em formas e nas limitações que isso traz.



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