domingo, 1 de fevereiro de 2009

A Favorita em Pílulas

Para quem achou estranho o fato de eu, no post anterior, não ter mencionado “A Favorita”, bem, a novela merece pílulas próprias:

1) Em príncipio, no fim de Duas Caras, pensei “pqp, João Emanuel Carneiro no horário das 8? Esse cara é muito fraco!”. Meu pensamento foi baseado em “Da Cor do Pecado” uma trama que começou empolgante, mas caiu em uma certa chatice após a morte da personagem de Lima Duarte e personagens engraçados caíram em uma repetição chato. Em “Cobras e Lagartos” deu-se o contrário: a trama começou insossa, com personagens fracos para Daniel de Oliveira e Mariana Ximenes e uma forçada de barra para atores fracos como Carolina Dieckmann – chatíssima como uma vilã que não convencia nem como bruxa da Branca de Neve em encenação do teatro Ziembinski- e Henri Castelli. Daí surgem Taís Araújo – em atuação superior a da protagonista da trama anterior de João Emanuel –, Marília Pêra e, principalmente, Lázaro Ramos que roubou a cena na novela e foi o grande nome da novela em uma trama muito fraca.

2) Ao contrário de que alguns pensaram, não achei a trama fraca no começo...Patrícia Pillar – o grande nome da novela – e Claudia Raia – que não é grande atriz, mas mostrou competência –
mostraram desde o começo a que vieram. Quem não estava convencendo mesmo eram Carmo Dalla Vecchia e seu Zé Bob – era um personagem “pesado” para um ator do porte dele – e o sempre chatinho Tiago Rodrigues e seu igualmente chato Cassiano. No entanto, isso era questão de tempo...

3) Percebi como muitos que bons atores estavam com pouco destaque: foi assim com Cláudia Ohana, Malvino Salvador, Ângela Vieira, Alexandre Schumacher, Bel Kutner e Leonardo Medeiros. Foi então que o autor conseguiu arrumar tramas para as personagens, com o bem sacado triângulo amoroso Dedina – Elias – Damião e o contraponto de Cida com as outras irmãs e seu envolvimento com alguém mais jovem. Infelizmente, as personagens Arlete, Amelinha e Norton não tiveram a mesma sorte.

4) Jackson Antunes foi magistral na sua intepretação. O Leonardo tem muito a ensinar a Manoel Carlos como deve ser tratado o tema da violência intrafamiliar e/ou contra a mulher. O Marcos (Dan Stulbach – Mulheres Apaixonanadas) repete um clichê de um homem de classe média alta que só agride a mulher porque é um louco, um psicopata enciumado, por mais que o ator tenha feito “laboratório” no Instituto NOOS que trabalha com homens autores de violência e que trabalham com o mesmo pensamento que trago aqui. É como se Maneco nos dissesse que o machismo é circunscrito aos pobres e que os abastados quando agridem a mulher o faz por loucura. Já Leonardo é mais verossímil e , por isso, chocante: ele não é louco ou psicopata. A sua suporta perversão é nada mais nada menos a norma do homem “comum” brasileiro: um operário migrante nordestino, casado, machão que se acha dono da mulher- e tudo isso sem ser esteriotipado ou estigmatizante de um povo ou classe social- e, por isso, com direito até mesmo de agredi-la. E aos poucos ele caminha para um desfecho dramático: a cadeia e, ao sair dela, o desprezo da família e a possibilidade de mudança (ou não) agora em sua terra natal.

5) Na abordagem da homossexualidade um erro e um acerto. O acerto se deu na relação Catarina (Lilia Cabral, excelente) e Estela. Ali serviu para desvencilhar de um mito machista da mulher que se “torna” lésbica em função de um casamento mal-sucedido. Por outro lado a suposta “recuperação” de Orlandinho e a repetição de caricaturas toscas– o sensível fresco para o machão brigão fã de futebol quando se apaixona por Céu- foi a bola fora de João Emanuel, que também vacilou em “Da Cor do Pecado” ao não dar continuidade a um romance homossexual de Abelardo (Caio Blat) e o fez se envolver com a “cachorrona” Tina.

6) A família de Romildo Rosa foi outro acerto. Tratou-se de uma família negra sem cair em um discurso panfletário e, ao mesmo tempo, não era uma mimetização de um ideal branco. A escolha de Romildo como o político negro que vem das classes baixas e corrupto foi bem acertada, quebra com o mito do “bom selvagem” que existe quando se trata de temas diversos como racismo, homofobia, machismo e tudo o mais...ali não se tinha o “negro de alma branca”. O que faltou para João Emanuel foi um pouco do cinismo das tramas de Gilberto Braga e não tornar Romildo um político que se redime e confessa seus crimes no fim da trama.

7) Dedina por sua vez era uma Emma Bovary em verão pretensiosamente rodriguiana, A morte dela não fez muito sentido na trama.

8) A repetição do casal Tarcísio e Glória ocorreu mais uma vez. No entanto a quebra se deu com a atuação irrepreensível de Mauro Mendonça como Gonçalo, marido de Irene. Gloria Menezes por sua vez foi muito competente na composição da Irene, que despertou a raiva do publico devido a sua torcida por Flora. Só achei que no fim da trama ela poderia ficar sozinha, a exemplo do que ocorreu com Catarina.

9) Gostei do Dodi de Murilo Benício mesmo com aquele timbre para lá de estranho. A participação de Lucio Mauro mostra porque o paraense merece estar na galeria de grandes atores brasileiros. Teve gente torcendo o nariz para José Mayer por interpretar Augusto César, mas é ótimo para quebrar com a mesmice de personagem galã da andropausa. Cauã Reymond mostrou que pode ser pelo menos competente e a Lorena de Gisele Fróes foi uma das melhores surpresas da novela, bem como Alexandre Nero. Foi ótima a volta de Suzana Faini às telenovelas bem como Selma Egrey, que outro dia tomei um susto ao vê-la belíssima em um daqueles filmes anos 70 no canal Brasil

10) Claudia Raia defendeu bem a protagonista e no fim, Carmo Dalla Vecchia estava melhor em seu personagem. O Cassiano continuou o mesmo chato. Porém em nada se compara, na minha opinião, aos dois melhores vilões das telenovelas: Silveirinha e Flora.
Silveirinha é fáustico, um demônio que oferece a possibilidade do sucesso a Flora e Donatela, ou o Exu que faz favores para quem o agradar mais e até mesmo o Deus do livro de Jó, que pode ajudar a personagem a perder tudo e ao mesmo tempo, tal como no episódio de Caim e Abel, no Gênesis, acirrar a competição e a inveja entre as duas irmãs.
Flora por sua vez é a vilã mais sensacional. Ela não é carregada em maquiagem e não tem exageros. O preconceito dela não é aquele óbvio de Odete Roitiman pelos pobres, mas a recusa de uma vida de “classe média” como ela mesma diz na festa de casamento com Dodi e antes de ser presa. Flora não é uma “bombshell” sexual como Laura ou Nazaré e não precisa ser tão sonsa quanto Maria de Fátima. Basta apenas a frieza de uma psicopata que se faz de moça frágil por um lado e se revela cruel até mesmo com a filha em diálogos divertidíssimos com Silveirinha. As outras vilãs conseguem a empatia do público com facilidade. Flora já motiva a raiva, já que eram inúmeras as cartas nos jornais criticando a emissora pela existência de Flora...ela não quer apenas se dar bem, ela é o mal em estado bruto e é capaz de ludibriar até mesmo o público. É graças a ela e a uma trama bem feita, mesmo com os erros apontados, que João Emanuel Carneiro pode ter feito a melhor trama das telenovelas desta década desbacando os dramas familiares de Maneco, o mundo dos ricos de Gilberto Braga, as comunidades de Aguinaldo Silva, os mistérios de Silvio de Abreu, os italianos de Benedito Ruy Barbosa ou os povos exóticos e tramas “modernas” de Glória “Magadan” Perez.

Um comentário:

Leela disse...

Eu te indiquei para um selo, passe no meu blog pra pegar, ok?

:)