quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Consciência Negra: eu no podcast

Na última segunda feira tive a oportunidade de participar do podcast "The Library is Open", a convite do Thello, Rodrigo e Caio. Na maioria das vezes é um podcast dedicado a RuPaul Drag Race, com temas que interagem com outras questões LGBT e, em dados momentos -- quando a atração não é exibida -- há discussão específica de vários temas: representatividade, gordofobia, bifobia, homofobia, transsexualidades entre outros temas que podem ser conferidos na página deles. No último dia 20, foi a interseção entre negritude e LGBTQ, onde eu tive a alegria de participar com, além dos citados, com Jean e Guilherme. Quem quiser conferir, pode clicar, aqui.

A oportunidade pra mim foi boa, apesar da minha ansiedade e das constantes quedas do meu roteador. Puder colocar as minhas questões, vivências e pensamentos. Além disso, houve dois pontos que me ficaram ressaltados para mim.

O primeiro ponto é que com a participação do Guilherme, que é bissexual e de Jean, que é travesti, eu pude perceber e ouvir- escuta, este exercício sempre tão necessário- experiências que são diferentes das minhas. Ao mesmo tempo perceber o quanto a questão racial por vezes une nossas vivências.

O segundo ponto é que entre os realizadores estão pessoas com quem converso há anos e compartilhamos pontos em comum, até porque, entre outras coisas, somos bichas gordas. Mas ali estávamos conversando sobre um dos vários pontos em que nos diferimos e o peso que isso tem.

A partir dessas reflexões penso em outras questões. Uma, que foi colocado aqui pelo Spartakus Santiago. Para ele , o dia 20 e os demais dias não devem ser apenas para nós, pretos, falarmos de racismo. Temos muito mais a contribuir e dizer além disso. Nesse sentido acho que é importante a nossa criação e conquista de espaços para nossas vozes serem ouvidas, que a nossa produção seja vista.

Nesse sentido começo a entender melhor um dos motivos que me fizeram desfazer um a amizade essa semana naquela famosa rede social. Eis a situação: a pessoa reclamou sobre um artigo na seção de gastronomia de um jornal sobre a invisibilidade de restaurantes de imigrantes pretos africanos. O motivo da reclamação foi que, para essa pessoa, o racismo se opera "de verdade" em questões como o genocídio do povo preto e a desigualdade. Nesse sentido, reconheço que são temas urgentes e que jamais podem ser negligenciados, fato que prontamente concordei com a pessoa. Por outro lado, não gosto de uma ideia supostamente militante em que a discussão sobre negritude deve se dar apenas nos aspectos negativos, deixando de lado as potencialidades.

Pensando nas palavras do Jailson de Souza, doutor em educação e com origem no complexo da Maré, que dizem que está na hora de parar de apontar a favela só pelas carências (sem querer mascarar a inexistência delas) , deixando de lado o que é produzido lá. Posso ampliar essa noção para negritude. Somos bem mais que aquilo que as estatísticas de violência e desigualdade dizem, ainda que elas sejam extremamente importantes e apontem sim, questões urgentíssimas para a nossa sobrevivência. O incômodo mesmo é esse maniqueísmo e enquadramento.

Então, creio que há vários caminhos a serem tomados. Um deles é o fortalecimento daquilo que nós pretos produzimos. E, para brancos que querem contribuir com essa causa, usando o espaço de privilégio que essa sociedade há séculos racializadas (sim, não é invenção de americano nem do "politicamente correto") lhes confere, é dar e ouvir as vozes de pessoas pretas, refletir sobre a branquitude ( por favor, leiam esse texto da Gabriela  Moura) e abrir seus espaços de fala não só para a discussão do racismo, mas também para outros temas para não sermos apenas o token lembrado no dia 20 de novembro.

Sobre a nossa participação em contextos hegemonicamente brancos, a  Tia Má coloca mais ou menos isso na sua fala a respeito de sua participação no programa da Fátima Bernardes em plena Rede Globo, ainda que isso dê espaço para uma discussão para além desse texto.

Enfim, que a nossa consciência nos aponte não só a realidade a nossa volta e nos dê forças para as tantas lutas, mas que permita também o nosso brilho. Mais uma vez fica aqui meu muito obrigado pelo convite por aquela participação.

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