domingo, 2 de outubro de 2011

No leste, a razão

Sinceramente eu mesmo estava achando engraçado, senão ridículo, os meus textos sobre o que chamei de "quatro pontos cardeais do desejo" ou algo assim. Pareceu auto-ajuda barata e na minha cabeça vieram  vários professores me dizendo: mas tá, Odilon, qual o seu referencial teórico? O que você quer dizer com isso? Como você define desejo?

Essas perguntas e a excessiva auto-crítica se relacionam com o que resolvi colocar a leste nessa minha construção por vezes pueril mais prática: a razão.

Se a ideia de "norte do desejo" surgiu com uma conversa espontânea com um amigo, pensar sobre a razão (redundante, eu?) também surgiu de forma semelhante com várias conversas com diferentes amigos. Uma delas merece ser contextualizada.

O Osmar e o Matias me apontavam como uma certa criatura por quem me apaixonei nada tinha a ver comigo. "Di, ele é burrinho, não combina com você" "Você merece arrumar alguém mais compatível". Ok, muitos vão bradar, chamá-los de preconceituosos ou algo do tipo, mas afirmar que isso é hipocrisia e, ao mesmo tempo, falta de sensibilidade. No século XXI onde mal podemos separar razão e emoção (lá no "sul" do desejo) isso merece uma análise mais detalhadas.

Há a frase que "o coração tem razões que a razão desconhece". Pensamos logo nas emoções, mas vale pensar na razão, a razão como escolha. Algo que não é dado espontaneamente de um mundo perfeito, mas como criação humana.

Não é por acaso que em alguns momentos da história quando se há uma valorização da razão há de se valorizar o que é humano. Na Grécia Antiga, com seus deuses longe da perfeição judaico-cristã - ok, eles obedeciam ao ideal de beleza física em alguns casos - o aparecimento da filosofia significou uma ruptura com o pensamento mágico-religioso. A Renascença ao valorizar o que é humano abriu caminho para a ciência moderna ao tirar Deus do centro do universo culminando no Iluminismo, o século das luzes. Luz como sinônimo de razão.

O aparecimento do sol a leste, ao acordarmos, se assemelha com o nosso nascer. Ao longo do tempo vamos recebendo uma série de informações e trabalhando com elas (seria inteligência, isso?), confrontando-as com nós mesmos e com o mundo. A razão é construída e, obviamente, está de acordo com nossos desejos, sentimentos, intuição e tantas outras coisas.

E quando nos encontramos com o ser amado lidamos com ela, inevitavelmente. A comunicação, que tem seus componentes emocionais e ser uma forma de exercermos poder, tem essa ligação com o racional. Pela razão vamos dando forma ao que pensamos e sentimos. Trocamos ideias, experiências. Muitas vezes procuramos alguém que pense como a gente, outras, pessoas que possam pensar de uma maneira diferente. No meu caso específico, gosto muito da novidade, uma novidade que quebre a mesmice. Algo que o "burrinho" do começo desse texto não poderia oferecer.

Nesse sentido a argumentação dos meus amigos articulam o racional com o emocional. Se essas duas podem ser fontes de preconceito, no caso deles foi uma forma de compreender o desejo. Até porque o amor não é simplesmente a cama, o desejo sexual (como menciono no "norte do desejo") ou o que sentimos, as nossas emoções (o "sul" do desejo). A razão nos articula com o dia a dia, coma convivência, ela pede troca e se articula com o que queremos. E esse meu querer, compreenderam bem meus amigos, não era possível com aquele ser humano. Por amor, eles compreenderam o que minha razão quis escamotear por outras idealizações e fugas que não vem ao caso agora. De alguma forma, a minha razão que eu procurei por momentos desconhecê-las, comunicou o meu desejo. Eles estavam ali, a leste, onde o sol nasce, onde a luz começa.

A foto que ilustra esse post não é à toa. Já definiram a fotografia como a arte da luz, e quando o sol está lá a leste no comecinho de uma manhã sem nuvens tem-se uma luz maravilhosa. E, por mais que a fotografia possa parecer à primeira vista, algo frio - um dos componentes da máquina fotográfica é a "objetiva" - na verdade ela faz o oposto. Com a razão defini o enquadramento e em meio a linhas geométricas do prédio defini o que eu queria de acordo com o meu gosto. Não é à toa que minha professora de filosofia disse, para espanto de todos, que triângulos não existem, mas objetos com essa forma. Uma representação. Razão representa bem o que desejamos e selecionamos para quem estará do nosso lado.








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