domingo, 19 de fevereiro de 2017

Geração Y?

Agora de tarde o Vando me mandou esse texto, pois achou que era minha cara. Acho que ele se lembrou o quanto eu me empolgo com esses termos usados a respeito da geração Y, X, Millenials e tudo o mais.

O texto é longo e não sei se consigo resumir a ideia dele. Basicamente ele faz um comparativo entre a geração anterior, que não dispunha da tecnologia atual e conseguia se divertir e sustentar uma família com a atual, que tem milhões de ferramentas a sua disposição e no entanto ganha mal e tem todo o seu tempo tomado pelo trabalho.

A ideia que aparece no texto não é nova. Um dia desses o jornalista Xico Sá comentava o quanto se achava que nas redações de jornais as coisas mudariam quando as máquinas de escrever fossem substituídas pelos computadores e que, na prática, os jornalistas estão, atualmente, trabalhando mais e levando muita coisa pra fazer fora do horário de trabalho.

Isso levou o autor a questionar se de fato estamos vivendo uma geração livre quando na verdade somos uma geração de escravos. E que ao mesmo tempo, no Brasil, estamos submetidos às imposições dos clientes e que há uma exigência verbal de cordialidade para não ofender os clientes. Que o brasileiro "está acostumado ao mando" e que estamos formando uma geração de "bebês de meia idade".

Apesar de gostar da zoeira com esses nomes de gerações, eu acho que são generalizações complicadas e ao mesmo tempo falsas. Antes de qualquer coisa, convèm colocar uma das "n" definições que se encontra pra "geração Y" na internet. Tomei essa desta matéria da revista Galileu que, ao que consta, está de acordo com a ideia do autor do texto:
esses jovens são os representantes da chamada Geração Y, um grupo que está, aos poucos, provocando uma revolução silenciosa. Sem as bandeiras e o estardalhaço das gerações dos anos 60 e 70, mas com a mesma força poderosa de mudança, eles sabem que as normas do passado não funcionam - e as novas estão inventando sozinhos. "Tudo é possível para esses jovens", diz Anderson Sant'Anna, professor de comportamento humano da Fundação Dom Cabral. "Eles querem dar sentido à vida, e rápido, enquanto fazem outras dez coisas ao mesmo tempo."
Folgados, distraídos, superficiais e insubordinados são outros adjetivos menos simpáticos para classificar os nascidos entre 1978 e 1990. Concebidos na era digital, democrática e da ruptura da família tradicional, essa garotada está acostumada a pedir e ter o que quer.

Vivemos num país, segundo dados do IBGE de aproximadamente 190 milhões de habitantes. Se tomarmos a faixa etária da dita geração Y, ela representaria, em 2010, 26% da população aproximadamente. Imaginemos então o quão heterogênea essa parcela que representa mais que 1/4 dos brasileiros.

Se tomarmos como referência a classe média, parte do texto do autor pode fazer sentido. No entanto a realidade é mais complexa a apresenta bem mais variáveis do que "um bando de mimados" como pretende esse texto.

Muita gente sequer teve condições de terminar o ensino médio. Ainda temos casos de analfabetismo funcional na população, ainda que tenham ocorrido avanços no ensino fundamental nas últimas décadas. As escolas públicas, em sua maioria, estão em condições ruins, seja na própria estrutura material, como no apoio ao docente. Daí com essa precariedade no acesso ao ensino que parcela pode se dar ao luxo de pensar "vou criar uma startup" ou "quero um emprego com a minha cara com mil brinquedinhos no escritório" ou "vou fazer home office". A maioria das pessoas estão é mesmo encarando um transporte coletivo precário, saindo cedo de casa e chegando tarde ou fazendo mil malabarismos pra ter uma renda minimamente decente.

Não descarto a crítica em relação a suposta libertação que poderia vir com essa tecnologia. Agora, querer resumir esse grande contingente de pessoas a um bando de mimados ou que os clientes são pessoas mal acostumados a mando é reducionista. Isso pode funcionar - já que o texto usa a escola como exemplo- numa escola particular do Leblon. Na periferia de Araruama, o esforço dos professores é fazer com que os pais participem das reuniões ou por vezes tem que se envolver com casos de violência.

Claro que não cabe aqui fazer uma outra generalização do estilo "com a galera da baixa renda tudo é ruim", pois aí tem-se um novo reducionismo. O que precisa ser questionado é esse conceito de geração "x,y,z"que tenta agrupar tamanha heterogeneidade, ainda que eu entenda que o impacto das mudanças teconológicas atinge também os mais diversos grupos em diferentes estratos sociais.

Só pra finalizar vou trazer um pouco do que acontece aqui em Araruama, uma vez que trabalho com jovens, tanto de classe média como de classe mais baixa, sabendo que essa realidade está longe de representar sequer todo o município, menos ainda o Brasil.

Araruama é uma cidade que historicamente foi ligada à agricultura e pecuária e que a partir do século XIX teve expansão econômica por conta da produção do sal, que foi perdendo a força ao longo do século XX. No final desde mesmo século, a cidade testemunha um crescimento de pessoas vindo do Grande Rio em busca de melhor qualidade de vida e fugindo dos preços proibitivos da capital fluminense. Muitas fazendas se tornaram condomínios fechados e também teve um aumento da favelização. Pois bem, nesse contexto, a moçada aqui tem preocupações como a sua formação, já que não há universidade pública na região. Com a galera que estuda nos colégios públicos tivemos no ano passado ocupações em escolas estaduais, pois é notória a situação que se encontra em todo o Estado do Rio de Janeiro. Ao terminarem os estudos os jovens precisam arrumar trabalho no setor de comércio e serviços (bem diferente de criar startups ou trabalhar em um serviço em que tem uma mini quadra de golfe no escritório) com baixos salários ou então (os que podem) precisam ir para o Rio ou Niterói para fazerem seus cursos, ainda que as prefeituras da região disponibilizem transporte. Ou seja, é uma realidade bem diferente de uma galera mimada acostumada ao mando e que precisa de formas "polidas" de comunicação.

Então, justamente por observar o quanto é heterogênea a realidade brasileira em todos as faixas etárias da população, bem como suas diferentes demandas e necessidade que penso que agrupar essas diferenças em uma única letra do alfabeto se mostra equivocado.










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